22 de janeiro de 2011

Conversazioni tra Italia e Portogallo


 Foto: Manuel Henriques / DGArtes

Foi sob o título «Projectar na Europa» que decorreu a mesa que, no passado dia 20 de Janeiro no Politecnico de Milão, reuniu os arquitectos Manuel Aires Mateus, João Ferreira Nunes (Proap) e Giuseppe Marinoni e o fotógrafo Giovanni Chiaramonte.

A moderação ficou a cargo de Carlos Machado e Moura que, para além de apresentar os oradores, fez alusão ao encontro de Fernando Távora e Ernesto Nathan Rogers em 1951  referência central na apresentação do seminário  e evocou as grandes mudanças no mundo, nas cidades e nas sociedades que alteraram profundamente o exercício da profissão desde então. Com efeito, as gerações que precederam aquela representada na mesa assistiram às transformações do mundo levando a cabo actividades que lhes atribuíram o papel de protagonistas na modernização dos países e, no caso português, a um verdadeiro papel de emancipação social. No entanto, também graças à extensa circulação de imagens e de ideias, a arquitectura está hoje mais concentrada num âmbito intrínseco da disciplina do que propriamente nessas tarefas.

Giovanni Chiaramonte, fotógrafo que desde o final da década de '60 trabalha sobre a relação entre o lugar e o destino da sociedade ocidental, apresentou uma série de fotografias tiradas nas mais variadas cidades europeias.

Manuel Aires Mateus ilustrou três projectos apresentados a concurso: o Hotel Aquapura, no Alqueva (Monsaraz, 2007, 1º prémio); o Museu Parque de los Cuentos (Málaga, 2008, 1º prémio); e o projecto urbano para o Parque Mayer (Lisboa, 2008, 1º prémio), tendo este último sido resultado de uma parceria com João Nunes / Proap.

João Ferreira Nunes apresentou dois projectos: o da ETAR de Alcântara (Lisboa, 2005) desenvolvido com Manuel Aires Mateus; e uma proposta apresentada a concurso, o Parque CityLife (Milão, 2010, 2º prémio), em colaboração com o atelier Gonçalo Byrne Arquitectos.

Finalmente, o arquitecto Giuseppe Marinoni, professor do Politecnico de Milão, apresentou dois projectos urbanos, um Plano de Pormenor em Bergamo e o masterplan para a requalificação da área de Cascina Merlata, em Milão, tendo este último sido desenvolvido com João Nunes / Proap.

4 de janeiro de 2011

Seminário de Arquitectura em Milão



No dia 20 de Janeiro a partir das 14h terá lugar, na Aula Magna da Faculdade de Arquitectura do Politecnico de Milão, o segundo encontro do Seminário de Arquitectura «Conversazioni tra Italia e Portogallo». Trata-se se uma iniciativa comissariada pela arq.ª Maddalena d'Alfonso em colaboração com a Embaixada de Portugal em Roma.

No primeiro encontro, que decorreu no passado dia 30 de Novembro, os arquitectos Vittorio Gregotti e Manuel Salgado, entre o diálogo e a entrevista pessoal, abordaram o tema que dá título ao seminário, à luz das suas próprias obras e do seu percurso. Recorde-se que esta dupla é considerada a primeira equipa luso-italiana, que deu lugar à realização do Centro Cultural de Belém.

Esta segunda data é composta por três momentos: a apresentação do «Premio Piranesi» atribuído a João Luís Carrilho da Graça; uma mesa redonda sobre o tema «Projectar na Europa» com os arquitectos Manuel Aires Mateus, João Ferreira Nunes, Giuseppe Marinoni e o fotógrafo Giovanni Chiaramonte; e uma conversa «Sobre a Arquitectura e a Fotografia», entre o arquitecto Eduardo Souto Moura e o fotógrafo Gabriele Basilico.

O arquitecto Carlos Machado e Moura foi convidado pela Embaixada Portuguesa para apresentar e moderar a segunda mesa.

Seguir-se-à, às 18h30 na Sala Nardi da Faculdade de Arquitectura, a inauguração da exposição «No Place Like», que representou Portugal na última Bienal de Veneza.

O terceiro encontro desta iniciativa, entre os arquitectos Bernardo Secchi e Nuno Portas «Sobre a Cidade Europeia», realizar-se-à no dia 15 de Fevereiro às 16h30.

Pode consultar o programa aqui.

2 de janeiro de 2011

A internacionalização da arquitectura portuguesa e a italian connection


Artigo escrito em Dezembro de 2009 para a apresentação de uma candidatura a financiamento ao Instituto Camões para a realização de um ciclo de conferências sobre arquitectura portuguesa em Itália.


A arquitectura portuguesa conhece hoje um momento de particular difusão. Há 30 anos, Álvaro Siza era o único arquitecto português a construir no estrangeiro, mas hoje são cada vez mais a fazê-lo, como ficou evidente nos 21 projectos presentes na exposição «Arquitectura: Portugal fora de Portugal», patente ao público em Berlim no último mês de Março. Tem crescido também, nos últimos anos, o interesse pela produção arquitectónica nacional e multiplicam-se as exposições, as iniciativas e as publicações que lhe são dedicadas.

Em especial, a chegada do novo milénio, «acontecimento fortuito e, apesar disso, dotado de poderes mágicos em que parece que ou tudo se perde, ou tudo se ganha» (1) trouxe consigo um interesse pelas novas gerações de arquitectos. Neste cenário global, em parte devido a um certo estrelato internacional, o campo da arquitectura parece concentrar-se sob a influência do «eixo Erásmico» que une a ruidosa Roterdão à silenciosa Basileia (2). As novas gerações, todavia, têm sabido absorver as várias tendências internacionais, conferindo-lhes uma espessura realista, reconvertendo estas influências numa base disciplinar comum identificável e mantendo, no fundo, fidelidade ao Movimento Moderno.

Com efeito, a arquitectura portuguesa continua a caracterizar-se, genericamente, pela «sua qualidade tectónica (domínio dos materiais e atenção ao detalhe), pela sua composição (abstracta, clara e rigorosa) e pela sua capacidade topológica (o lugar como matriz)». (3)

Na última década esta atenção tem superado os limites da arquitectura e tem-se estendido à cidade e ao projecto urbano. Com efeito, o sucesso das recentes intervenções de requalificação urbanas levadas a cabo no país desde a Expo’98 de Lisboa – no âmbito: do Porto2001 Capital Europeia da Cultura, do campeonato europeu de futebol Euro’2004 e das transformações promovidas pelo programa Polis em 30 cidades – têm suscitado um grande interesse internacional. A testemunhar este reconhecimento está a entrega, em 2005, do prémio Sir Abercrombie de Urbanística da União Internacional dos Arquitectos (UIA) a Nuno Portas e um prémio especial do Grand Prix de l’Urbanisme do governo francês a Álvaro Siza.


É de referir que o início deste fenómeno da internacionalização da arquitectura portuguesa tem datas e protagonistas precisos.

Coincide aproximadamente com o 25 de Abril de 1974, a revolução dos cravos, data em que o país é acordado, de um dia para o outro, pela «divina surpresa» (4) de um país sem polícia política, nem censura nos jornais, nem mobilização obrigatória para a guerra no horizonte de vida, e se confronta com a possibilidade real de construir de raiz uma sociedade nova e diferente.

Nos anos seguintes os portugueses viveram, seguramente, os tempos mais exaltantes da segunda metade do século xx, perante o olhar atento da Europa e do Mundo que, apenas dois anos antes, tinha assistido à liquidação, a tiros de blindados e de caças, do socialismo de rosto humano de Salvador Allende no Chile. E acompanhava o avanço imparável dos vietcong num Vietname do Sul onde o poder norte-americano, humilhado, haveria de retirar, pelos telhados da sua embaixada, os últimos soldados e funcionários diplomáticos. (5)

Nuno Portas, então Secretário de Estado da Habitação e do Urbanismo, depois de uma importante investigação sobre o campo da habitação no LNEC em que se debruça sobre várias experiências italianas – da “continuidade” rogersiana aos bairros INA-Casa (Ridolfi, Quaroni, etc.) –, vai lançar uma série de programas inscritos na reflexão aberta por Campos Venuti em Bologna e que abriria portas para os “planos da terceira geração”. (6)

Entre estes programas destaca-se o SAAL, inovador tanto na investigação sobre a habitação social como nos métodos urbanísticos de proximidade, como a auto-organização (selfhelp), a participação e a intervenção activa dos moradores. Sobretudo no Porto, surgem arquitecturas que revisitam as propostas radicais dos anos 20 e 30 (Oud, May, Taut) conjugando-as com uma atenção ao sítio herdeira de Távora e do Inquérito. (7)

A obra de Álvaro Siza – em especial as operações de São Vítor e da Bouça, no Porto, e, mais tarde, da Malagueira em Évora – vão ter grande projecção na imprensa internacional, em França na revista L’architecture d’aujourd’hui de Bernard Huet, mas sobretudo em Itália, através de Lotus e Casabella, pela mão de Vittorio Gregotti e Pierluigi Nicolin. Em 1977, na sequência de um convite de Emilio Battisti, Alves Costa, Siza e Portas visitam uma dezena de escolas de arquitectura, de Turim a Palermo, «para mostrar os projectos da participação». Poucos anos antes, em 1972, Gregotti publicava, na revista Controspazio, o primeiro artigo internacional sobre a obra de Siza, então um desconhecido arquitecto português que tinha conhecido através de Portas.

Para muitos estudantes europeus, «cansados de um ensino demasiado teórico, a atracção por essa Obra amarrada à realidade era uma tábua de salvação». (8) Com efeito, ela vai abrir uma «terceira via» – à qual Frampton dará o nome de regionalismo crítico – num debate arquitectónico dominado, na Europa, entre o international style e a intromissão pós-modernista, que viria a ser consagrada na «Stada Novissima» da Bienal de Veneza de 1980.

Será de resto a experiência da participação que irá motivar os convites feitos a Siza para alguns projectos no estrangeiro que lhe trarão fama internacional. Em particular, o Schlesisches Tor, mais conhecido por Bonjour Tristesse, no âmbito do IBA de Berlim (1980-1984) e Schilderswijk, em Haia (1983-1988).
Entretanto, ainda em 1975, Portas convida Gregotti a ir a Lisboa fazer uma possível adaptação do projecto do Quartiere ZEN (Palermo, 1969-73) no Plano Integrado de Setúbal. Aí conhece Manuel Salgado, com quem inicia uma longa colaboração.

Também no Bairro da Belavista, integrado no mesmo plano e desenhado por José Charters Monteiro, trabalhará outro arquitecto italiano, Aldo Rossi – então muito influente no debate teórico internacional – que projecta um edifício residencial com comércio e serviços, com 650 metros de comprimento, que não chegou a ser realizado.

Segue-se uma série de trocas e “contaminações” entre a arquitectura portuguesa e italiana, bem como várias experiências conjuntas entre arquitectos dos dois países, nomeadamente a longa e discreta colaboração entre Siza e Roberto Collovà, para o arranjo de algumas ruas e o terreiro de uma igreja em ruínas em Salemi, na Sicília.

Porém, o exemplo mais evidente desta colaboração luso-italiana é, indiscutivelmente, o Centro Cultural de Belém (1989-93), desenhado por Gregotti e Salgado. Trata-se de um edifício de grande retórica, ícone do Portugal moderno e de respiro europeu e também a primeira grande realização contemporânea de um arquitecto estrangeiro no país, mais tarde seguida pela Estação do Oriente (Lisboa, 1995-98) de Santiago Calatrava, do Pavilhão Atlântico (Lisboa, 1995-98) dos SOM, do waterfront atlântico do Porto (1999-2002) de Manuel Solà-Morales e da Casa da Música (Porto, 1999-2005) de Rem Koolhaas/OMA, para além das encomendas a Piano, Gehry, Foster e Nouvel.


Numa altura em que são vários os arquitectos portugueses que trabalham em Itália e vice-versa, decidimos convidar alguns dos actores principais desta longa e fértil relação para uma reflexão conjunta.
Uma conversa sobre as grandes mudanças ocorridas recentemente no campo da arquitectura: no âmbito formativo, nas condições e processos de produção arquitectónica – que alteraram a posição do arquitecto no quadro mais complexo da construção enquanto facto financeiro – e na difusão e visibilidade das imagens e dos seus autores.

Em Portugal, há pouco mais de vinte anos, as escolas de arquitectura eram apenas duas em Portugal, enquanto hoje, entre públicas e privadas, contam-se mais de trinta. A actividade de projecto é hoje mais interdisciplinar e encontra-se submetida a uma cada vez mais complexa série de actividades de controlo burocrático e institucional. A profissão redefiniu-se progressivamente, não mais assente na tradicional relação com o cliente e com o construtor, mas enquanto uma mais genérica «sociedade de serviços». Ainda, para uma expressão de Gregotti no seu último livro Contra o fim da arquitectura (9), à máxima de Louis Sullivan «form follow function» sobrepõs-se uma nova máxima «form follows market».

Enfim, pretendemos também interrogar estes autores, à luz das suas mais recentes realizações, sobre o sentido «nacional» da arquitectura.

Uma identidade complexa, como é evidente quando vemos a obra de Siza, um arquitecto que «é mais holandês que os holandeses» (10), mais suíço que os suíços (Casa Van Middlen-Dupont, Bélgica, 1997-2003) e não menos brasileiro, na forma como usa a força brutalista de Bo Bardi, no edifício da Fundação Iberê Camargo (Porto Alegre, Brasil, 1998-2005).

Como concluía Távora no seu Cultura arquitectónica portuguesa no mundo, «Cremos que o pensamento da arquitectura contemporânea portuguesa, nos seus sectores mais representativos, não esquece, antes pratica essa nossa referida tradição, não impositiva mas simpatizante e compreensiva, de consideração dos homens e dos seus lugares, garantindo aos seus edifícios e espaços a identidade e a variedade, como que num fenómeno de heteronímia, no qual o autor se desmultiplica, não por incapacidade conceptual ou outra, mas pelo princípio de respeito, quando merecido, que a outros somos devedores(11)

  1. TAINHA, Manuel: Arquitectura: arte, profissão, modo de vida?, conferência na sede da Ordem dos Arquitectos Portugueses, Lisboa, 1991
  2. RODEIA, João Belo: Línea de tierra: presentación de una nueva generación de arquitectos portugueses in Arquitectura portuguesa – una nueva generación, revista 2G, n. 20/IV, Gustavo Gili, Barcelona, 2001, p. 4
  3. LOPES, Daniel de Castro: Notas sobre algunos arquitectos portugueses in Arquitectura portuguesa – una nueva generación, cit., p. 23
  4. LOURENÇO, Eduardo: Os militares e o poder, Editora Arcádia, Lisboa, 1975, p. 80
  5. GOMES, Adelino, CASTANHEIRA, José Pedro, Os loucos dias do PREC, Expresso/Público, Lisboa, 2006
  6. CAMPOS VENUTI, Giuseppe, La terza generazione dell’urbanistica, F. Angeli, Milano, 1987
  7. AMARAL, F. Keil do (coord.) Inquérito à Arquitectura Popular, Associação dos Arquitectos Portugueses, Lisboa, 1961
  8. BEAUDOUIN, Laurent, O agrimensor, in MACHABERT, D., BEAUDOUIN, L., Álvaro Siza – Uma questão de medida, Caleidoscópio, 2009, p. 14
  9. GREGOTTI, Vittorio, Contro la fine dell’architettura, Einaudi, Torino, 2006
  10. Alves Costa sobre o Schilderswijk em Haia, in COSTA, Alexandre Alves, Álvaro Siza, Imprensa, Lisboa, p. 42
  11. TÁVORA, Fernando, Cultura arquitectónica portuguesa no mundo in BECKER, Annette, TOSTÕES, Ana, WANG, Wilfried (org.), Portugal: Arquitectura do século xx – Catálogo de uma exposição, Prestel, München, 1997, pp. 140-143 (versione italiana in TÁVORA, Fernando, Immigrazione/emigrazione. Cultura architettonica portoghese nel mondo, Casabella 700, maggio 2002, Electa, Milano, pp. 6-7)
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