26 de fevereiro de 2013

Internacionalização: a história como não costuma ser contada

Artigo publicado no Boletim Arquitectos 229 de Janeiro de 2013.

Foto: Bing Maps

Agora que se tornou inevitável a internacionalização, perante o marasmo da economia nacional, somos por vezes confrontados com histórias, frequentemente carregadas de romantismo, de jovens arquitectos que se lançam em aventuras além-fronteiras, alcançando encomendas no estrangeiro.

As histórias são apenas um relato parcial dos factos, e deixam muitas vezes sem resposta perguntas que interessam ao leitor do BA: «Como fizeram? Com quem falaram? Como chegaram lá?»

Queríamos, portanto, enquanto jovens arquitectos de 30 anos, partilhar a nossa pequena experiência de internacionalização, em particular as vicissitudes da construção de uma escola em Itália.

Para quem está em início de carreira e tem poucos contactos, internacionalização é frequentemente sinónimo de imigração. Foi assim connosco. O Carlos fez Erasmus em Florença e, tendo estabelecido fortes relações de amizade, transfere-se, em 2006, para Itália, trabalhando numa agência pública de transformações urbanas e em vários projectos em parceria com um urbanista italiano.

Com o passar do tempo, acaba por receber algumas encomendas directas e convida o Luís, que permaneceu em Portugal, a trabalhar em conjunto. Nenhum dos projectos acaba por se concretizar – sempre abandonados por problemas económicos –, contudo, com o regresso ao país em 2010, montam um gabinete no Porto com o nome “mavaa arquitectos associados”. Os contactos com Itália continuam e surge uma primeira hipótese de obra “de raiz”. Trata-se do projecto de uma escola em Montepulciano (Siena), na sequência de participação num pequeno concurso por convite em parceria com o referido urbanista.

O desafio era evidentemente difícil: com poucos meses para a elaboração do projecto, a Câmara pretendia usar o mesmo valor que tinha destinado à realização de uma escola primária para realizar um edifício com duas escolas integradas: uma primária e um jardim de infância. Tudo isto, idealmente, numa estrutura com uma elevada classe energética e com o recurso a materiais ecológicos.

O projecto ficou integralmente a nosso cargo. No entanto, a coordenação e os contactos com o cliente foram feitos pelo nosso parceiro italiano. E inicia-se um processo conturbado. Com o projecto a ser revisto radicalmente em fase de execução vezes sem conta, para se ajustar ao enorme espartilho orçamental. Com as dificuldades inerentes à distância e ao facto de o contacto com o cliente não ser directo: muito acaba por se perder pelo meio.

E o trabalho faz-se com muito esforço: meses de trabalho de escritório, muitas horas ao telefone, muita discussão e incertezas sobre o rumo a seguir, aprendizagem e utilização de software italiano específico para medições/caderno de encargos em obras públicas, uma semana por mês em Itália para acompanhamento e fiscalização da obra, com todos os encargos inerentes.

Para além disso, a nossa maneira de fazer “à portuguesa” colide com as vontades de rápida solução dos vários interlocutores e com um ciclo produtivo orientado para soluções standard sem grande primor pela qualidade da execução e pormenorização construtiva.

Passados 2 anos e meio, estão executados o tosco e as infra-estruturas, o revestimento exterior em tijolo maciço e as paredes interiores em gesso cartonado. As obras serão retomadas em Janeiro, após uma pausa de alguns meses, por dificuldades económicas da construtora e aparente falência do banco que assegura o financiamento da obra.

A internacionalização é, por vezes, um caminho árduo, pouco rentável – até à data esta aposta não terá pago as despesas –, onde a persistência e a incerteza estão de mãos dadas, numa aposta travada pelo amor à arquitectura.

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